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Transições de fase de segunda ordem

Uma transição de uma fase com uma determinada simetria para outra fase com diferente simetria não pode se dar continuamente, no sentido de que não é possível que existam estados em que as duas fases se confundam, como acontece com líquido e vapor. Em cada estado de agregação o corpo possui uma ou outra das simetrias e, por isso, é sempre possível especificar em que fase ele se encontra.

A transição entre diferentes simetrias se dá, usualmente, por saltos, produzindo-se uma reestruturação súbita da rede cristalina, acompanhada de uma mudança súbita no estado de agregação do corpo. Pode haver, não obstante, um outro tipo de transição entre simetrias diferentes em que as propriedades do corpo variam continuamente (embora a simetria varie descontinuamente). São as chamadas transições de fase de segunda ordem. Para exemplificar, recorreremos inicialmente a um exemplo imaginário.

Imagine-se um corpo que, a baixas temperaturas, cristalize no sistema tetragonal, isto é, tenha uma célula cristalina em forma de paralelepípedo retangular de base quadrada, com a altura $c$ diferente da aresta da base $a$. Suponhamos que $c$ seja ligeiramente maior do que $a$, e que os coeficientes de dilatação sejam tais, a baixas temperaturas, que as arestas da base se dilatem mais do que a aresta $c$. A uma determinada temperatura, $a$ se tornará igual a $c$. Suponhamos que, a partir dessa temperatura, os coeficientes de dilatação passem a ser iguais. Então, àquela temperatura, a simetria cristalina passa a ser cúbica. Como a modificação das posições dos átomos é contínua, muitas das propriedades do corpo variarão continuamente: volume, energia interna, entropia, etc. Por isso, em particular, uma transição desse tipo não é acompanhada de liberação de calor.

Por outro lado, no ponto de transição se produz uma variação descontínua na dependência dessas quantidades com a temperatura. Por exemplo, até por construção , o coeficiente de dilatação térmica é muito diferente em uma ou outra fase. Os calores específicos são igualmente descontínuos.

Para que seja possível passar de uma simetria a outra por mudanças contínuas das posições dos átomos, é necessário que uma das fases possua uma simetria mais elevada que a outra, isto é, contenha todos os elementos de simetria da outra fase e mais alguns. Assim, é impossível uma transição de segunda ordem entre um sistema hexagonal e um cúbico, ou entre um cristal qualquer e um líquido.

Para caracterizar quantitativamente as simetrias (ou a ordem), introduz-se, seguindo Landau, o parâmetro de ordem $\eta$, definindo-o de maneira que seja zero na fase mais simétrica, e diferente de zero na fase menos simétrica. A fase menos simétrica será chamada, por brevidade, de fase assimétrica.




Exemplo: o cristal de titanato de bário ($BaTiO_3$). A temperaturas superiores a $120^{\circ}C$ o cristal é cúbico. Quando se abaixa a temperatura pos átomos de $Ti$ e $O$ deslocam-se ao longo de uma das arestas do cubo, e a célula cristalina se transforma em um paralelepípedo, isto é, a simetria vira tetragonal. Neste caso o parâmetro de ordem pode ser o tamanho do deslocamento. Na fase cúbica, mais simétrica, $\eta=0$. Na fase tetragonal, $\eta\neq 0$.

As transições de fase de segunda ordem não ocorrem apenas nos cristais. Transformações entre fases que se distinguem po simetrias de outro tipo podem também ser de segunda ordem: assim, o ferromagnetismo; a passagem de um metal ao estado supercondutor; a passagem do hélio ao estado superfluido.

Examinemos o comportamento dos potenciais termodinâmicos nas transições de fase de primeira e segunda ordem, em particular o da energia livre de Gibbs (ou, potencial termodinâmico tout court. Em transições de primeira ordem, o ponto de transição não é uma singularidade dos potenciais termodinâmicos. Sejam $\Phi_1(P,T)$ e $\Phi_2(P,T)$ os potenciais termodinâmicos das fases $1$ e $2$. Prolongando o potencial $1$ além da temperatura de transição (com a mesma pressão ), há ainda uma situação de equilíbrio (por exemplo, superfusão ) que é um mínimo local, mas não global. Logo, os dois potenciais são contínuos na transição (e, portanto, iguais na temperatura de transição ). A situação édiferente nas transições de segunda ordem. Prolongando-se o potencial termodinâmico para o outro lado do ponto de transição , ele não corresponde a nenhum estado de equilíbrio. Não há um fenômeno análogo à superfusão nesse tipo de transições . Deve-se, portanto, esperar que o ponto de transição de segunda ordem seja uma singularidade para o potencial termodinâmico.


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Henrique Fleming 2002-04-15