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A equação da continuidade

A equação da continuidade é nossa velha conhecida. Na linguagem tradicional ela se escreve
\begin{displaymath}\
\frac{\partial \rho}{\partial t}+div \; \vec{j}=0
\end{displaymath} (117)

Vamos introduzir a seguinte quantidade, de 4 componentes:
\begin{displaymath}\
j^{\mu}\equiv (c\rho, \vec{j})
\end{displaymath} (118)

que significa o seguinte: as componentes de $j^{\mu}$ são $j^{0}=c\rho$, $j^1=j_x$, $j^{2}=j_y$ e $j^3=j_z$. Com essa notação , a equação da continuidade pode ser expressa de uma forma compacta:
$\displaystyle \frac{\partial j^{\mu}}{\partial x^{\mu}}$ $\textstyle =$ $\displaystyle \frac{\partial j^0}{\partial x^0}
+\frac{\partial j^1}{\partial x^1}+\frac{\partial j^2}{\partial x^2}
+\frac{\partial j^3}{\partial x^3}$ (119)
  $\textstyle =$ $\displaystyle \frac{\partial \rho}{\partial t}+\vec{\nabla}.\vec{j} \;,$ (120)

logo, a equação da continuidade pode ser escrita
\begin{displaymath}\
\frac{\partial j^{\mu}}{\partial x^{\mu}}=0
\end{displaymath} (121)

Mas há muito mais do que comodismo nisso. O próximo passo é o seguinte postulado: $j^{\mu}$ é um 4-vetor. No momento em que digo isto, a Eq.(121) adquire um significado muito maior, pois, se $j^{\mu}$ é um 4-vetor, $\frac{\partial j^{\mu}}{\partial x^{\mu}}$ é um invariante (ou escalar), e a equação (121) diz que um escalar é igual a zero num sistema de referência. Logo, é igual a zero em qualquer sistema de referência (inercial, bem entendido). Ou seja, supor que $j^{\mu}$ é um 4-vetor é um grande passo, cheio de conseqüências. Por que $j^{\mu}$ é um 4-vetor? É um palpite (embora tenha o nome pomposo de postulado). Vamos ver se dá certo. Se todas as consequências desse palpite forem verdades da natureza, o palpite está apoiado pela experiência. É assim que se faz ciência5. Suponhamos que $j^{\mu}$ seja, mesmo, um 4-vetor. Então,
\begin{displaymath}\
j^{' 0}=a^{0}_{\; \nu}j^{\nu}
\end{displaymath} (122)

Para a transformação especial de Lorentz, teremos
\begin{displaymath}\
j^{' 0}=a^0_{\; 0}j^0+a^0_{\; 1}j^1
\end{displaymath} (123)

Tomemos aquele particular $j^{\mu}$, em $S$, que tem a forma $j^{\mu}\equiv (c\rho, 0)$, ou seja, uma carga em repouso em $S$. Então, no sistema $S'$,
$\displaystyle j^{' 0}$ $\textstyle =$ $\displaystyle a^0_{\; 0}j^0$ (124)
$\displaystyle c\rho'$ $\textstyle =$ $\displaystyle a^0_{\; 0}c\rho$ (125)
$\displaystyle \rho '$ $\textstyle =$ $\displaystyle \gamma \rho$ (126)

Temos ainda a componente $j^{' 1}$
$\displaystyle j^{' 1}$ $\textstyle =$ $\displaystyle a^1_{\; 0}j^0$ (127)
  $\textstyle =$ $\displaystyle -\gamma \beta c\rho$ (128)
$\displaystyle j^{' 1}$ $\textstyle =$ $\displaystyle -\gamma\rho v$ (129)
  $\textstyle =$ $\displaystyle -\rho ' v$ (130)

O resultado faz sentido, pois o observador ligado a $S'$ vê uma carga se movendo com velocidade $-v$ e, pelo cálculo anterior, com uma densidade de carga $\rho '$. Uma conseqüência importante é que a carga é um invariante. De fato, pela contração de Lorentz sabemos que um volume $V$ para o observador em $S$ é visto pelo observador em $S'$ como $V'=\frac{1}{\gamma}V$. Então, temos
\begin{displaymath}\
\rho ' V'=\gamma \rho \frac{1}{\gamma}V = \rho V
\end{displaymath} (131)

e a carga é um invariante. Um bom teste experimental da invariância da carga é o seguinte: considere um fio comum de instalação elétrica. Ele é neutro, as cargas negativas exatamente compensando as cargas positivas. Aqueço o fio. À nova temperatura, os elétrons terão ganho muito mais velocidade do que os íons positivos (pois a energia cinética média é igual para os dois, e as massas são muito diferentes). No entanto, o fio continua neutro, mostrando que a igualdade das cargas continua a ser verificada.
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Henrique Fleming 2002-04-15